As mudanças nas regras do distrato de imóveis aprovadas na Câmara dos Deputados ainda podem se converter em mais dor de cabeça para quem desistir da compra de um apartamento na planta. Para o comprador, além de uma multa maior sobre o valor pago, de até 50%, o ressarcimento do restante a receber pode demorar até sete meses, além do tempo da obra. Para as empresas, que celebraram a mudança, os resultados também podem demorar a aparecer. Segundo analistas, como um imóvel leva, em média, de um a dois anos para ser erguido, o efeito da lei deve ser observado nos balanços das construtoras somente a partir de 2021.
Até mesmo agências de classificação de risco, como a Moody’s, que já soltaram relatórios com perspectivas positivas para o futuro das construtoras brasileiras, estão céticas sobre a capacidade de a lei resolver crises do setor, como a recuperação judicial de grandes incorporadoras como PDG e Rossi.
– Como a lei não tem efeitos retroativos, uma queda mais brusca no nível de distratos é esperada no longo prazo – diz Carolina Chimenti, analista de infraestrutura da Moody’s.
Até lá, o problema do distrato segue uma batata quente no balanço das construtoras. Segundo os dados mais recentes da Abrainc, associação brasileira das incorporadoras, 27% das 115.930 unidades habitacionais entregues entre janeiro e agosto de 2018 haviam sido distratadas antes da entrega das chaves. É uma fatia menor que o recorde de 46% do 3º trimestre de 2016, mas distante do padrão até 2014, anterior à crise, quando raramente passava de 10%.
Lei pode ser ‘tiro no pé’
Há quem acredite que as regras mais duras vão afastar os possíveis compradores. Para a Associação Brasileira de Mutuários da Habitação (ABMH), que reúne advogados especializados em ações judiciais por direitos habitacionais, o projeto de lei é um tiro no pé das construtoras porque pode desestimular vendas. O advogado Arthur Rollo, ex-titular da Secretaria Nacional do Consumidor, do Ministério da Justiça, concorda. Além do aumento do percentual da multa, diz ele, o consumidor terá de pensar duas vezes, já que a nova lei prevê que o ressarcimento ao comprador será feito até 30 dias após o habite-se do empreendimento:
– Na prática, significa que, além do prazo da construção, pode-se esperar mais sete meses para receber o dinheiro. Isso porque a lei prevê que as construtoras podem atrasar até 180 dias a entrega, sem penalidade. E ainda concede 30 dias para o pagamento após o habite-se.
Quando fez o distrato, em 2014, Suelen Batista teve 20% de tudo que havia pagado retido:
– Se essa regra estivesse valendo naquela época, eu sequer teria feito o negócio.
O risco de uma queda no interesse por imóvel na planta, por ora, é um mal menor na visão de lideranças do mercado. A lei, dizem, é bem-vinda por coibir a ação de “aventureiros”.
– É preciso resgatar a cultura de cumprimento de contratos. O interessado num imóvel deve ter o devido preparo financeiro e pensar muitas vezes antes de assinar – diz Flávio Amary, presidente do Secovi-SP, sindicato de empresas do setor em São Paulo.
Novas regras:
Direito a arrependimento
A nova lei cria o direito de arrependimento da compra em até sete dias, contados da data da aquisição.
Multa
A nova regra prevê multa de até 25% para empreendimentos sem patrimônio de afetação (quando o caixa do projeto é ligado ao da construtora) e de até 50% para obras com contas isoladas das demais da empresa.
Taxa de corretagem
Além da multa, a taxa de corretagem (de até 6% do preço do imóvel) pode ser retida pela construtora.
Prazo para pagamento
O consumidor só receberá o valor devido depois do distrato 30 dias após o habite-se do imóvel. Assim, o reembolso pode levar mais de 200 dias, já que pela lei a construtora pode atrasar em até 180 dias a entrega.
Fonte: O Globo
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