A polêmica sobre moradores terem ou não animais de estimação em seus apartamentos é antiga. Para alguns, são fofinhos e companheiros, e fazem parte da família. Mas, para outros, causam incômodo pelo barulho e pelo cheiro e não deveriam estar num espaço comunitário, como um condomínio.
A briga, porém, ganhou um novo capítulo no mês passado. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os condomínios não podem proibir seus moradores de criar animais de estimação — desde que os bichos não ponham em risco a segurança e a tranquilidade daqueles que lá residem.
A decisão aconteceu depois que uma enfermeira de Brasília teve o pedido para manter uma gata em seu apartamento negado duas vezes. O caso foi parar no STJ, que entendeu que a restrição era ilegítima, pois o animal não é nocivo aos condôminos.
Os advogados Leandro Sender e Denise Rocha, especialistas em condomínios, explicam que não há nenhuma lei específica sobre ter ou não animais de estimação nos edifícios. Hoje, as proibições ou permissões são determinadas por cada condomínio por meio de suas convenções.
Com a decisão do STJ, isso pode mudar e abrir precedente para que os Tribunais Estaduais sigam a mesma linha de entendimento.
— No processo julgado pelo STJ, o relator, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que é garantido ao condômino o direito de usar e fruir de sua unidade, ao passo que não pode a entidade condominial criar regras que limitem o direito constitucional de propriedade dos moradores — destaca Sender.
— Os indivíduos que se sentirem lesados, seja com a vedação ou com a permissão do condomínio, poderão ingressar com ação judicial, usando a decisão da 3ª Turma do STJ como base legal — acrescenta Denise.
Os dois lados
Em uma prédio na Lapa, a estudante de filosofia Jessica Linhares teve problemas ao adotar um cachorro e uma gata, mesmo sendo permitida a presença deles.
— No início, havia muita pressão para que não os tivesse. Botaram um aviso dizendo que cães grandes eram proibidos. A cada latido, a síndica me ligava. Eu sabia que era proibido proibir, então, a cada reclamação eu questionava sobre os outros barulhos que também incomodam. Agora está mais tranquilo e outras pessoas passaram a ter animais de estimação em casa.
Uma delas é a sua amiga Aimée Magalhães, que se mudou para o mesmo prédio após adotar um cachorro e ter problemas no antigo condomínio em que morava. Ela também acha injustas a proibição e as reclamações.
— A lei maior deve ser o bom senso. É normal um cachorro latir, assim como acontece de um bebê chorar alto de madrugada. É preciso ter tolerância. Dizer que não pode ter animal de estimação é limitar o espaço do vizinho — diz Aimée, que pondera:
— Pode acontecer de um cachorro latir alto o dia todo, mas é uma situação atípica que tem que ser averiguada, porque algo está errado. No geral, são apenas latidos normais.
Já o engenheiro Heraldo Melo diz que muitas vezes não é apenas um latido, e que o barulho intenso e diário é perturbador para os vizinhos. Ele conta que em seu prédio, em Icaraí, havia um morador que tinha um cachorro e um gato e que o cheiro no elevador e no corredor o incomodavam tanto quanto o medo de ser mordido. O caso foi levado para a assembleia e o casal de donos dos bichos mudou-se para uma casa.
Tolerância e bom senso para a boa convivência
A advogada Denise salienta que, na maioria dos casos, os condôminos reclamam de barulho e mau cheiro nas áreas comuns causadas pelos pets, e que essa questão deve ser avaliada se for realmente prejudicial para a segurança, a higiene ou o sossego dos demais condôminos.
Ela frisa, contudo, que também há casos em que os condôminos reclamam da simples presença dos animais, sem qualquer motivo específico, alegando que não são obrigados a conviver com animais alheios.
— É óbvio que cachorros latem, pássaros cantam e gatos miam. Mas o simples fato de os bichos emitirem sons não é motivo para caracterizar incômodo ou outro tipo de prejuízo. É preciso bom senso e ver se o animal provoca barulho excessivo, avança em outros moradores, invade espaços privados ou inadequados e faz necessidade em locais públicos, por exemplo.
Fonte: O Globo (Morar Bem)
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